05/07/2024 às 00h31min - Atualizada em 05/07/2024 às 00h31min

Provas e Expiações

Rogério Candotti | [email protected] | blogdorogerinho.wordpress.com

Os contos lovecraftianos publicados no início do século passado são na verdade uma metáfora sobre os nossos medos e anseios. Quem corrobora isso é o próprio Stephen King, cuja adaptação de O Nevoeiro (2007) para o cinema foi uma das suas preferidas entre as inúmeras já feitas. Na trama disponível na Netflix e no Prime Vídeo, o temor pelo desconhecido dentro daquele nevoeiro acaba reunindo um grupo de pessoas num supermercado onde são obrigados a resolver as diferenças políticas e religiosas enquanto o caos reina lá fora. A comida à vontade e a fina camada de vidro que os separa de criaturas peçonhentas induz uma falsa sensação de segurança porque os nervos estão à flor da pele, cuja série homônima da Netflix de apenas uma temporada em 2017, aprofundou ainda mais o conflito ao ignorar os efeitos especiais para se concentrar em discussões acaloradas que levaram a uma chacina sem precedentes. Para piorar, a fanática religiosa do filme, interpretada por Marcia Gay Harden, fomenta o medo naquelas mentes fragilizadas através de um discurso tão longo e perigoso quanto o de Fidel Castro na época em que o romance homônimo foi publicado. Com o fim da ladainha, o herói (Thomas Jane) e sua contraparte (Laurie Holden) puderam completar a missão de autodescobrimento e voltar para casa. 
Já Bird Box (2018), da Netflix, é uma metáfora sobre a maternidade, cujos monstros aparecem logo depois da gestante Malorie Hayes (Sandra Bullock) pensar em doar o filho para uma instituição de caridade; por isso a médica é a mesma do hospital e no refúgio seguro. Ocorre que ao se separar da irmã Jessica (Sarah Paulson), Malorie é obrigada a conviver com pessoas estranhas de comportamentos distintos, sem poder confiar em ninguém. Dessa forma, a sua provação será cuidar do filho legítimo logo após o parto e da filha de uma jovem com quem não simpatizava nem um pouco. Apenas quem possui algum distúrbio mental consegue ver aqueles monstros sem enlouquecer, embora não basta tapar os olhos com uma venda porque a mente ao longo do tempo fica impregnada de emoções negativas: tão insuportável quanto o canto da sereia, levando a vítima ao suicídio.
 Nesse sentido, o spin-off Às Cegas: Barcelona (2023), também da Netflix, descreve a obsessão de um pai para levar a filha até um local seguro sem perder a fé e os valores cristãos, de modo a não ceder às tentações do demônio que invade a sua mente com frequência.  
Por fim, nos dois primeiros episódios da franquia dirigida, escrita e protagonizada por John Krasinski a partir de uma ideia original dele, cuja metáfora sobre a paternidade é através de uma família isolada com milhares de monstros de audição ultra sensível ao redor. Devido ao sucesso de Um Lugar Silencioso e Um Lugar Silencioso — Parte II, o prelúdio protagonizado pela inconfundível Lupita Nyong'o era inevitável, ao estilo de Guerra dos Mundos com Tom Cruise e Steven Spielberg na direção. Na trama de Um Lugar Silencioso: Dia Um (2024), em exibição nos cinemas, a paciente com câncer terminal precisa cruzar Manhattan até poder embarcar numa balsa para estar livre de alienígenas cegos que acabaram de invadir o planeta subitamente. Com cenas de terror bastante competente e excesso de aventura, o longa dirigido agora por Michael Sarnoski é um ótimo programa de férias; com destaque ao gato de estimação, eventualmente sem coleira, de modo a aumentar a angústia do espectador, na torcida pela sobrevivência de Sam (Nyong'o) cuidando daquele gracioso bichano.

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