​A cena mais audaciosa do cinema nacional

Rogério Candotti | [email protected] | blogdorogerinho.wordpress.com

É uma madrugada fria na Serra Catarinense. Vinte pessoas percorrem um difícil caminho pela lama para subir até o topo de um penhasco com uma queda de 800 metros.
Seis horas de logística depois, uma equipe de filmagem, duas motos e o dublê e campeão mundial de wingsuit, Gabriel Lott, se preparam para gravar uma cena inédita no cinema nacional, uma cena que está em planejamento há 24 meses.
A cena é para um filme de ação de cinema independente, que não conta com dinheiro público ou edital, o que na prática significa que todo esse esforço culminará em somente um take de 30 segundos.
“O drone tá pronto?” pergunta André Luís, diretor, produtor e ator do filme. Ele faz a pergunta para o rádio em sua mão. O ambiente está tenso. O dublê Gabriel Lott é a pessoa mais qualificada no mundo para fazer essa cena, mas o risco de dar algo errado é palpável. Há vários fatores a serem considerados, mas a produção é enxuta e são muitas funções para cada integrante da equipe.
O operador do drone acena de longe, um nó se formando no estômago enquanto se prepara para fazer o enquadramento necessário para capturar a cena.
“A RED também já tá gravando”, informa o diretor de fotografia pelo rádio, apontando para a câmera 8K de última geração, usada nas produções Hollywoodianas de ponta. Por dentro, ele reza baixinho para essa não ser aquela uma vez em cem que dá erro no cartão de memória.
André e Gabriel trocam um aperto de mão com entusiasmo. “Boa sorte” não faria justiça ao momento, e “divirta-se” seria leviano demais. “Obrigado cara, bom salto” é a mensagem do diretor.
Gabriel dá a partida na HONDA CRF 450R, uma moto de competição de 75 mil reais. Ela ronca e treme entre as suas pernas enquanto espera o sinal.
Do outro lado do cânion, o resto da equipe assiste de longe em um vídeo que acabou viralizando na internet em 2021 pelo que aconteceria a seguir. O sinal é dado, Gabriel acelera em direção à ponta do penhasco com nada à sua frente além de uma queda livre.
A moto derrapa no mato do caminho, o piloto conserta a linha. Ele acelera para a velocidade máxima e o fim do caminho está chegando, ele acaba, ele se lança em direção ao horizonte… hora de soltar a moto.  Ela começa a cair, o mecanismo do paraquedas aciona e… falha. A moto despenca 800 metros em queda livre e se espatifa em um barranco. Gabriel Lott abre seu próprio paraquedas e flutua para fora do quadro, pousando 2 minutos depois a um kilômetro de distância em uma grama fofa ao lado de um rebanho de vacas.
“A moto já era” lamenta alguém da produção no vídeo viralizado, olhando entre as copas das árvores por algum sinal do paraquedas. “Corta. Pegamos?” pergunta André, antes mesmo de Gabriel pousar, seus olhos também já procurando onde caiu a moto.
“Conseguimos" diz André, olhando as imagens aliviado mas já pensando como recuperar os destroços da moto, que precisará de outro dia e uma logística à parte.
Três meses depois, o ator Tom Cruise posta, pela primeira vez, que está filmando uma cena parecida, com orçamento milionário, dezenas de câmeras, computação gráfica, um helicóptero e uma rampa gigantesca para melhorar o ângulo do salto e cordas de segurança na moto e no ator. “Mal posso esperar pra ver a versão dele no cinema, mas nós fizemos primeiro” , conta o diretor.
"Tração" gira em torno de Ajax, (Marcos Pasquim), que é um conhecido piloto profissional de motocross. Tudo muda quando sua mulher morre e ele se vê sozinho cuidando de sua filha, Isadora (Bruna Altieri). Certo dia, Ajax e seus amigos são abordados por um milionário, DiMello (Nelson Freitas, no melhor vilão de sua carreira), que os convida para uma grande competição que envolve várias categorias de motos. No fim, se tratava de uma armadilha, e agora eles precisam dar um jeito de escapar, culminando em uma frenética sequência de perseguição que dura mais de 40 minutos. 
Inspirado em filmes de ação com roubos e perseguições da década de 60-70, “Tração” é o primeiro filme nacional de gênero a retratar pilotos de motocross e motovelocidade, além de ser o primeiro filme nacional a ter uma sequência de perseguição com Drift, graças à participação do piloto Fiuk que fez seus próprios stunts no longa.
O elenco é completado por André Ramiro ("Tropa de Elite"), Paola Rodrigues ("Desafio Egito na Pegada"), Bruna Altieri ("Sistema Bruto") e Mauricio Meirelles ("Foi Mau").
dia 29/06 em todas as redes de cinema do Brasil.
James Salinas, roteirista dos filmes `SP: Crônicas de uma cidade real", “Tração”, “Máscaras”,  “Amor, confuso amor”, e “Vagabundos Enrascados”, Diretor dos documentários "Vira-latas" e "Diário de uma metrópole".@james_salinas