03/03/2022 às 23h28min - Atualizada em 03/03/2022 às 23h28min

​Joana D'arc feminina e não feminista

Rogério Candotti | [email protected] | blogdorogerinho.wordpress.com

Jeanne d’Arc tornou-se um símbolo nacional francês e um dos personagens mais famosos da história da humanidade. A Virgem d'Orleães foi fundamental para o fim da Guerra dos 100 Anos (1337-1453) que na verdade durou 116 anos. Ocorre que em 1328, o rei francês Carlos IV morreu sem deixar um herdeiro e os ingleses por serem os parentes mais próximos dos últimos reis da dinastia carolíngia que dominava o país desde 987, consideraram-se herdeiros legítimos, declarando guerra aos primos. Em 1422, o rei Carlos VI morreu e o novo Delfim, Carlos VII, que ainda não havia sido coroado, abriu as portas do seu humilde lar para ouvir a donzela interiorana que em poucos dias derrotou os adversários usando uma surpreendente estratégia militar sem qualquer experiência no ramo. Vestida de pajem, sem capacete, a novata analfabeta de apenas 17 anos motivou os soldados e convenceu generais e aristocratas machistas da sua estratégia brilhante a fim de libertar Orléans do cerco inglês em 8 de maio de 1429, inspirada pelo verdadeiro amor à pátria, o primeiro país a se tornar uma nação selada com o sangue da heroína, cuja unidade jamais será desfeita ou aniquilada. A comandante ruiva de olhos azuis só não expulsou todos os adversários do país naquele mês porque foi capturada em Compiègne pelos Borguinhões, uma facção criminosa composta por revolucionários franceses que apoiavam os ingleses. De acordo com as obras espíritas: Crônicas de além-túmulo, Joana D'arc Médium e a História de Joana D'arc, Ditada Por Ela Mesma, a jornada de redenção da camponesa de Domremy foi semelhante a de Jesus Cristo antes dela entregar o Mestre aos sumos sacerdotes por trinta moedas de prata na encarnação anterior. A vida pública da discípula fiel ao Cristo dessa vez, durou apenas três anos até ela ser traída pelo amado rei Carlos VII que acabara de assumir o trono em Reims, e pelo Conde de Luxemburgo que recebeu dez mil libras em ouro oferecidas pelo monarca inglês. Até a cena de Saint-Ouen contém muitas semelhanças com a do Jardim das Oliveiras. A Virgem Lorena foi queimada em praça pública pelo fogo que purificaria a sua alma, encerrando o seu ciclo de encarnações na Terra. Jeanne, a Donzela, era feminina e não feminista, a primeira pessoa a entender o significado de pátria, nação e humanidade. A camponesa caridosa que cedia a cama aos necessitados, acreditava na Igreja única e santa, incapaz de se submeter à Igreja militante. A jovem cristã possuía o dom da premonição ostensiva, visão e audição, orientada pelo arcanjo Miguel, Gabriel e os Espíritos de Santa Catarina e Santa Margarida, empunhando na batalha a espada que Carlos Martel depositara na igreja de Santa Catarina de Fierbois, na região Loire, e o estandarte grafado Jesus Maria em homenagem ao anel que a mãe Isabelle Romée lhe deu. Joana foi condenada em um julgamento fraudulento, cujo objetivo era queimá-la antes daquele processo nulo chegar às mãos do Papa Eugênio IV, pois o crime imputado à ela foi ter se vestido de homem sem capacete, o que motivou os companheiros até a vitória triunfante. A comissão de inquisidores era formada por ministros da igreja e doutores da lei hipócritas que durante todo o tempo obrigavam-na a ficar de pé por horas a fio, suportando o peso de grossas correntes, sempre com perguntas irrelevantes sobre os aspectos físicos dos Espíritos que a guiavam com intuito apenas constranger a acusada. O veredito partiu deste diálogo objetivo: “Queres, sim ou não, submeter-te à Igreja?” – “Vim ao encontro do rei para salvação da França, guiada por Deus e por seus Espíritos. A essa Igreja, a de lá do Alto, me submeto, com relação a tudo o que tenho feito e dito!” – “Assim, recusas submeter-te à Igreja, somente. Pelo que respeita às minhas visões, não aceito o julgamento de homem algum!”. Joana d'Arc foi queimada viva, em Rouen, no dia 30 de maio de 1431 com apenas 19 anos e dois meses de idade, um símbolo nacional da França por decisão do imperador Napoleão Bonaparte. No dia 18 de abril de 1909 Joana foi beatificada pelo Papa Pio X e, posteriormente, declarada santa em 1920 pelo Papa Bento XV. 
A padroeira da França chegou às telonas no Natal de 1916 antes mesmo da sua canonização. Cecil B. DeMille, o rei dos filmes mudos, foi um dos 36 fundadores do Oscar. Joana d’Arc – A Donzela de Orleans foi baseada na peça de Friedrich Schiller de 1801, Die Jungfrau von Orleans,a primeira película a usar o Handschiegl Color Process em vermelho e amarelo na cena dela queimando na fogueira. Em 1926 temos outro clássico do cinema mudo considerado pela revista “Sight and Sound”, como um dos 10 maiores filmes de todos os tempos em suas listas de 1952, 1972 e 1992. O Martírio de Joana d’Arc do dinamarquês Carl Theodor Dreyer  consagrou a brilhante interpretação da atriz Renée Jeanne Falconetti pela face espantada de olhos esbugalhados ao ser interrogada pelos juízes inquisidores sem maquiagem como se ela tivesse visto um fantasma antes de ser torturada por aproximadamente 15 minutos. A película esteticamente magnífica foi banida na Inglaterra, por mostrar cenas em que Joana é atormentada por soldados ingleses que lembravam graficamente a tortura do Cristo pelos romanos. O negativo original foi dado como perdido, até a fita master ser encontrada num sanatório para doentes mentais em Oslo, na Noruega, em 1981. Em 1961 o diretor Robert Bresson trouxe ao público uma versão falada, sucinta e objetiva de apenas 65 minutos que também foi baseada nos documentos oficiais daquele julgamento político, cuja comparação com a obra de Dreyer é inevitável. Em O Processo de Joana d’Arc vemos a personagem histórica (Florence Delay) compenetrada nas respostas desconcertantes aos juízes capciosos que tiveram de transferir o interrogatório a um lugar mais reservado, longe do público.  
Joan, a virgem I – As batalhas, e Joan, a virgem II – As prisões, é o filme mais longo da heroína dividido em duas partes com quase 6 horas de duração no total, desde a sua saída do vilarejo de Domrémy até Vaucouleurs ao encontro de Robert de Baudricourt sem nunca tê-lo visto. O capitão do Delfim de França providenciou à camponesa a escolta de um cavaleiro, um escudeiro e quatro servidores até Chinon, residência oficial do futuro rei. A superprodução Joana d’Arc de 1948 foi protagonizada por Ingrid Bergman, um dos rostos mais bonitos do cinema somado à belíssima fotografia misturada ao pôr do sol alaranjado em contraste com a armadura prateada dos combatentes franceses. Porém o épico de ação mais famoso foi a versão de Luc Besson que estreou em 1999. A trama inicia aos 13 anos da Virgem Católica, frequentadora assídua da igreja vizinha após ouvir o chamado de um dos seus mentores espirituais pela primeira vez. Aos 17 anos, Joana partiu em direção a Burei, onde habitava um de seus tios, para lá ganhar Vaucouleurs e a França sozinha debaixo do céu imenso, por uma estrada semeada de perigos. Obediente às suas vozes do céu na batalha de Orléans, a comandante na flor da idade (Milla Jovovich) impõe uma estratégia militar em caráter de urgência que beirava a loucura. Por fim, temos duas obras espíritas: o musical italiano de 1954 dirigido por Roberto Rossellini e o americano, Santa Joana, dirigido por Otto Preminger, quatro anos depois. Joana d’Arc de Rossellini protagonizado novamente por Ingrid Bergman é a filmagem de um espetáculo encenado na primeira apresentação em 5 de dezembro de 1953 no Teatro San Carlo, em Nápoles. Em uma atmosfera onírica, Joana d'Arc, queimada na fogueira, é acompanhada por uma plêiade de Espíritos liderados por São Domingos, refletindo no Limbo ao lado dele sobre os seus últimos momentos na Terra. Aqui os juizes que a condenaram são aliados ao Diabo, o presidente do júri é um Porco e o chanceler um Burro. O Rei da França representa a Loucura e o Duque de Borgonha (a Avareza), cede ao quarto rei (a Morte). 
Em 1923, apenas três anos depois de Joana ter virado santa, o grande escritor irlandês George Bernard Shaw publicou sua peça, Saint Joan, e por conseguinte três anos depois ganhou o Prêmio Nobel de Literatura. A obra homônima adaptada para o cinema em 1957 é a que melhor retrata o comportamento espiritualizado da médium sensível, cuja fé movia montanhas e até navios de guerra. O escritor adepto ao Socialismo Fabiano nascido numa família protestante em 1856 dedicou a sua vida à causa operária durante a Segunda Revolução Industrial antes da formação da União Soviética. Na trama o espírito Joana D'Arc (Jean Seberg) após a morte conversa com os seus principais algozes em espírito, perdoando-os de coração, enquanto recorda a sua jornada redentora.

Joana d’Arc – A Donzela de Orleans (1916) - Nota: 4,0 
O Martírio de Joana d’Arc (1928) - Nota: 4,0 
O Processo de Joana d’Arc (1962) - Nota: 3,5 
Joan, a virgem I – As batalhas (1994) - Nota: 3,0 
Joan, a virgem II – As prisões (1994) - Nota: 3,0 
Joana d’Arc (1948) - Nota: 4,0 
Joana d’Arc (1999) - Nota: 4,0 
Joana d’Arc de Rossellini (1954) - Nota: 3,0 
Santa Joana (1957) - Nota: 4,5 

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