09/05/2024 às 22h21min - Atualizada em 09/05/2024 às 22h21min

​200 anos de escravidão

Rogério Candotti | [email protected] | blogdorogerinho.wordpress.com

Harriet — O Caminho para a Liberdade (2019) passou despercebido no Oscar, tal qual a sua personagem histórica — mistura de Moisés e Joana D'arc. Na verdade, seu nome de batismo era Araminta ou apenas Minty (Cynthia Erivo), nascida no início da década de 1820 numa fazenda em Peter’s Neck, no condado de Dorchester, Estado de Maryland, onde apanhava muito de capatazes ao lado de toda família. No entanto, na adolescência, uma grave pancada na cabeça com um pedaço de metal de aproximatamente 1kg acabou despertando a sua mediunidade ostensiva em prever o futuro, falar com Deus e com os Espíritos Superiores, por quem era guiada pelas rotas ideais de fuga, a partir de 1849, quando escapou daquele cativeiro até a Filadélfia onde não havia escravidão. Vestida de homem, agora como Harriet Tubman, foi responsável direta pela libertação de mais de 300 escravos em 19 missões de resgate com a ajuda dos integrantes da Sociedade de Amigos — os Quakers.
Durante a Guerra de Secessão (1861 – 1865) exerceu as funções de cozinheira, enfermeira e espiã, libertando cerca de 750 escravos: a primeira mulher a planejar e liderar um ataque de guerra pelos Estados Unidos. 
A atriz Cynthia Erivo antes de estrear no cinema protagonizou o revival da Broadway como Celie, enquanto “A Pequena Sereia”, Halle Bailey foi sua inseparável irmã, Nettie. Halle teve de reprisar o papel novamente porque o musical produzido por Quincy Jones foi adaptado para o cinema, embora sem a mesma grandeza. Ao contrário da película dirigida por Steven Spielberg em 1985, disponível no Max: onde Whoopi Goldberg é Celie, seu pai Albert (Danny Glover) e Sofia (Oprah Winfrey). O problema de A Cor Púrpura (2023), disponível também no Max, foi estabelecer o tom correto daquela obra cinematográfica, uma vez que a relação selvagem entre Celie e o marido se misturava abruptamente aos alegres números musicais dos irmãos, confundindo a todo momento, alegria e sofrimento.
Dessa forma, no romance epistolar de Alice Walker, vencedor do prêmio Pulitzer, Celie é vítima de uma sociedade patriarcal, dominada por negros abusivos, cruéis e autoritários do início do século XX. Aquela garota do sul dos Estados Unidos escrevia cartas como se fala, recorrendo apenas a Deus: talvez por ainda ter esperanças em ser ouvida por Ele, enquanto desfrutava da companhia privilegiada da irmã — sua única amiga. Contudo, a chegada da mentora espiritual, Shug Avery, foi a chance que ela tanto esperava em ascender socialmente, mesmo sendo feia e analfabeta: sem jamais perder a fé em Deus. Curiosamente, os melhores filmes da carreira de Sidney Poitier ocorreram no fim da segregação racial. Aqueles personagens interpretados por ele, eram verdadeiros heróis comuns — dispostos a cumprir o dever acima de tudo —, apesar do risco iminente em serem presos ou espancados até a morte por racistas de plantão. O principal deles, rendeu duas continuações no cinema e a 19.º posição entre os maiores heróis de todos os tempos, segundo o American Film Institute em 2007, cujo filme ficou na 75.º posição entre os 100 melhores de todos os tempos, além da frase “Eles me chamam de senhor Tibbs!” na 16.ª posição. Na trama, disponível na BP Select, Virgil Tibbs é um detetive equilibrado de argumentos técnicos e pontuais contra o “Estado Confederado” do Mississipi. Os primeiros 10 minutos do longa vencedor de 5 Oscars já definem o brutal assassinato antes mesmo de acontecer; envolto na trilha sonora composta por Quincy Jones, com destaque a voz inconfundível de Ray Charles: uma aula de cinema audiovisual, equiparado ao início de “Era Uma Vez no Oeste”. A câmera em zoom constante enquadra o trem chegando, assim como o carro do policial inseguro ao passar pela casa da garota nua, coberta apenas pela moldura da janela do seu quarto: No Calor da Noite (1967); até ele encontrar um cachorro esfomeado na porta do restaurante sujo onde pretende jantar. Esse início impactante deixa o espectador hipnotizado, interagindo a todo momento com aquele elegante paladino da justiça, muito à frente do seu tempo; apesar do arrogante chefe de polícia Bill Gillespie (Rod Steiger) desviar constantemente a investigação do caminho certo.

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