23/03/2023 às 23h52min - Atualizada em 23/03/2023 às 23h52min

História do Cinema: Parte II

Rogério Candotti | [email protected] | blogdorogerinho.wordpress.com

O diretor de La La Land, Damien Chazelle há 20 anos idealiza Babilônia (2022), disponível no Now, uma tragicomédia absurda em homenagem à história do cinema quando os EUA eram os únicos credores da Europa arrasada na Primeira Guerra, cuja euforia levou aos “Loucos Anos 20”, marcado por sexo, drogas e jazz. Aproveitando a fartura econômica no auge do cinema mudo, o fundador da Paramount, Adolph Zukor, cria o mercado das celebridades ao estabelecer um contrato exclusivo  rigorosíssimo com 22 das maiores estrelas de Hollywood, o mesmo número no logo da empresa. Entre elas: Gloria Swanson e Mary Pickford. Assim, o Hollywood Star System tornava refém do estúdio tanto o público quanto as celebridades, obrigando-as a participar de bacanais e atuar sempre do mesmo jeito. Em uma dessas orgias, nos idos de 1926, a selvagem aspirante à atriz, Nellie LaRoy (Margot Robbie), mistura de Clara Bow e Joan Crawford, cuja mãe vive num hospício e o pai alcoolizado, ganha o seu primeiro papel no cinema com a ajuda do coordenador da festa: “Manuel faz tudo” (Diego Calva), enquanto ele limpava cocô de elefante até auxiliar o astro Jack Conrad (Brad Pitt), inspirado em Clark Gable e John Gilbert. Nessa época em que não havia áudio sincronizado, era possível rodar diversas películas ao mesmo tempo no mesmo estúdio, até a chegada do som no ano seguinte, em cujo ambiente exigia-se agora silêncio absoluto ao invés daquele caos ao ar livre. A cena clássica de captação do som em homenagem a Cantando na Chuva (1952), reflete a paciência hercúlea que o elenco e a equipe de produção deveriam ter no meio do deserto sem ar condicionado. Originários de famílias disfuncionais, os vaidosos Jack e Nellie não se adaptaram à maior crise da sétima arte, sendo difamados a todo momento por colunistas de fofocas como Elinor St. John (Jean Smart), mistura de Louella Parsons com Hedda Hopper. Todavia, o imigrante mexicano (Calva) largou tudo e constituiu familia na sua Terra Natal após ser perseguido por um mafioso implacavel, na péle de Tobey Maguire.
George Valentin (Jean Dujardin) também entrou em pânico após a chegada dos filmes falados, em cujo sonho onde tudo se ouve, menos a sua voz. O protagonista de pura expressão corporal e sorriso fácil lembra Douglas Fairbanks, Rodolfo Valentino, John Gilbert e Gene Kelly, enquanto Bérénice Bejo (Peppy Miller) à Greta Garbo, pois a atriz obrigou o estúdio a escalar John Gilbert (1897 – 1936) como o seu par em Rainha Christina (1933), visando impulsionar a carreira decadente do astro, cujo legado serviu de inspiração para o multipremiado Nasce Uma Estrela (1937) e as suas versões subsequentes, estreladas por Judy Garland, Barbra Streisand e Lady Gaga. No entanto, quem rouba a cena em O Artista (2011), na HBO, é o cachorrinho Uggie, vivido por Jack, ao salvar o dono amargurado do ­suicídio.
Ave, César! (2016) se passaria na década de 1920, mas os irmãos Coen preferiram em 1951. Nos estúdios da Capitol Pictures, Eddie Mannix (Josh Brolin), como Adolph Zukor, mantém os escândalos dos atores fora das garras das colunistas gêmeas Thora e Thessaly Thacker (Tilda Swinton), reproduzindo a rivalidade entre Hedda Hopper e Louella Parsons, enquanto grandes produções são supervisionadas pelos cineastas Laurence Laurentz (Ralph Fiennes) e Arne Seslum (Christopher Lambert). Em Marujos do Amor Channing Tatum dança e sapateia à la Gene Kelly, ao mesmo tempo que Scarlett Johansson encarna Esther Williams em A Escola de Sereias e Veronica Osorio imita Carmen Miranda. Não muito longe dali a céu aberto, Alden Ehrenreich homenageia os astros do Western: Gene Autry e Roy Rogers, enquanto George Clooney homenageia o épico Quo Vadis? Antes do galã ser sequestrado pelos roteiristas na Lista Negra do Comitê de Atividades Antiamericanas, no qual Elia Kazan depôs, redimindo-se mais tarde em Sindicato de Ladrões. A ladainha socialista acabou fascinando Whitlock (Clooney), da mesma forma, o dinheiro do resgate foi por água abaixo sem o conhecimento do comandante do submarino soviético (Dolph Lundgren).
Billy Wilder ganhou o aval do estúdio para criar uma história original que se confunde com a decadência dos artistas hollywoodianos após a Segunda Guerra. Vide Gloria Swanson, cuja carreira decolou em 1919, graças ao papel principal em No Alvorecer da Verdade (Don't Change Your Husband), dirigido por Cecil B. DeMille, e em Minha Rainha (1932) pelo cineasta Erich von Stroheim, o mordomo de Norma Desmond (Swanson) em Crepúsculo Dos Deuses (1950), disponível no Telecine. Swanson havia se casado cinco vezes e estava nove anos longe das telas jogando cartas com os amigos: Buster Keaton, H. B. Warner e Anna Q. Nilsson, interpretado por eles mesmos no filme noir com onze indicações ao Oscar. A exemplo da algoz Hedda Hopper e do diretor Cecil B. DeMille ao gravar de fato Sansão e Dalila no estúdio 18 da Paramount quando Norma Desmond, apegada ao passado, veio lhe pedir emprego encarecidamente, apesar da falta de intimidade com o microfone. A personagem dependente do cinema mudo, vestida de luto e óculos escuros já foi interpretada por Glenn Close no musical da Broadway e por Dercy Gonçalves em A Grande Vedete, apesar de Mae West, Mary Pickford e Pola Negri terem recusado o papel. Betty Schaefer (Nancy Olson), ao contrário, é uma jovem flexível, coerente e maleável, que acredita no esforço próprio até depois do expediente, levantando a moral de Joe Gillis (William Holden), membro daquele triângulo amoroso sem fim, enquanto o amante não consegue vender os seus roteiros de filmes B a Hollywood e ainda sofre a má influência da dona da mansão decrépita, onde o “Brás Cubas Americano” virou refém ao se acomodar, até ser tarde demais.

Link
Notícias Relacionadas »
Comentários »
Comentar

*Ao utilizar o sistema de comentários você está de acordo com a POLÍTICA DE PRIVACIDADE do site https://gazetadepinheiros.com.br/.