04/11/2022 às 01h07min - Atualizada em 04/11/2022 às 01h07min

​Movimento Pró-Pinheiros: participando do planejamento do bairro

O bairro de Pinheiros figura entre os bairros do Centro Expandido de São Paulo com sua destacada diversidade, uma paisagem e um conjunto urbano marcados pela variedade de usos, tipologias arquitetônicas e população - moradora e flutuante, composta de trabalhadores e visitantes - que ajudam a compor esse mosaico.  Tal diversidade vem sendo apagada nos últimos anos, a partir das transformações incentivadas pelo Plano Diretor vigente, que estimula o adensamento construtivo próximo aos eixos de transporte. Essa proposta bem-intencionada, que visava ao adensamento populacional por classes de mais baixa renda em áreas bem dotadas de infraestrutura, está sendo deturpada em um processo de verticalização exacerbada, que não respeita as especificidades locais do tecido urbano, nem a diversidade de conjuntos arquitetônicos pré-existentes.
Vilas, predinhos e construções tradicionais, testemunhos de diversos períodos da urbanização do bairro e da cidade, estão sendo sistematicamente demolidas. Em seu lugar, surgem torres, geralmente de altíssimo padrão, que impactam no meio local e nas redes de infraestrutura, sem que haja qualquer diagnóstico de sua capacidade instalada ou planejamento do cenário futuro. Vale lembrar que essa mudança radical se repete em outros bairros consolidados, sem que a população tenha clareza do resultado dessas transformações - e sem possibilidades de ser efetivamente ouvida nesse processo. Moradores e observadores urbanos veem a destruição de referências e paisagens urbanas com a sua substituição por edificações novas que refletem uma cultura urbana e arquitetônica que não reconhecem e indagam - sem resposta - sobre que São Paulo está sendo construída e a quem ela serve.
Esse panorama motivou a organização de um grupo de moradores que vem se mobilizando para interferir nesse processo e garantir a preservação das qualidades ambientais do bairro. O movimento Pró-Pinheiros surgiu assim, em 2021, para tentar interferir no processo de revisão do Plano Diretor Estratégico da cidade por meio de melhor participação dos cidadãos e corrigir as distorções dos instrumentos que incentivam essa transformação radical do território e da paisagem. A luta iniciou com a constante ameaça de destruição do conjunto de 52 casas que representam o modus vivendi do bairro, uma zona onde predominam residências e comércios, o Quadrilátero Vilas do Sol. Desde então, age contra a perda da identidade local, a gentrificação - que é o processo de substituição de uma população de menor renda por outra mais rica - e a expulsão de pequenos comércios e serviços tradicionais, que não conseguem se manter nos seus pontos, e famílias de moradores não conseguem mais viver no bairro inflacionado pelo custo de vida, aluguel e IPTU.
A frente de ação se desdobra ainda contra a destruição ambiental, que se dá por meio do corte massivo de árvores, do sombreamento causado pelas novas torres (que não tem limite de altura!), da impermeabilização exagerada e da criação de ilhas de calor, entre outros. Sem falar nos impactos causados pela concentração espacial de um alto número de obras que avançam dia e noite, gerando poluição sonora e do ar, tráfego intenso de caminhões e máquinas, que impactam fortemente na saúde dos moradores.
Por conta da acelerada destruição e das consequências momentâneas ou permanentes que essas obras geram, o coletivo vem atuando em diferentes frentes com vários grupos voluntários de trabalho empenhando-se em resolver e cobrar o poder público em suas responsabilidades. Foram criados abaixo-assinados com solicitações que marcam preocupações do bairro, contra a verticalização inadequada no Quadrilátero Vilas do Sol e por uma praça na Rua Dr. Virgílio. Desde a participação no mencionado processo de revisão do Plano Diretor, foram entregues variadas propostas pela sociedade civil dentro das observações dos impactos citados, passando por importantes tratativas junto ao Ministério Público. Dessa forma, o movimento tem feito cobranças para que a legislação ambiental e urbana cumpra os seus princípios e objetivos primordiais.
Além disso, tem estreitado relações com as universidades, participando de atividades de extensão dos alunos de Arquitetura e Urbanismo. Realizou caminhadas guiadas pelo bairro, discutindo in loco os diferentes estágios de preservação e destruição do ambiente; aulas e seminários sobre ativismo urbano em bairros consolidados, além de propostas de projeto coletivo de espaços públicos. Têm participado dessa rede de trocas a USP, o Mackenzie e a Escola da Cidade.
Com o crescimento numérico do grupo e sua projeção nas redes sociais e em vários veículos da imprensa, está pautando debates junto a instituições como a OAB e, mais recentemente, está consolidando a ideia de elaboração de um Plano de Bairro. Esse instrumento de planejamento deverá ser responsável pela preservação de suas qualidades e pelo seu desenvolvimento sustentável, evitando a destruição completa do patrimônio ambiental e cultural em nível local. O grupo exerce assim cidadania, participação social e mobilização coletiva. Além da representação no CADES Pinheiros e na participação na Frente São Paulo pela Vida, a recente eleição do Conselho Participativo Municipal, com diversos integrantes do movimento eleitos na Subprefeitura de Pinheiros, demonstra a importância de se organizar coletivamente em prol da vida da comunidade, da cultura e da paisagem do lugar em que vivemos.
*Michel Chaui do Vale é arquiteto e paisagista, integrante do movimento Pró-Pinheiros, morador do bairro há 22 anos e atualmente é Conselheiro Participativo Municipal pela Subprefeitura de Pinheiros.
*Rosanne Brancatelli é publicitária, fotógrafa, autora do Manifesto contra a Verticalização Inadequada no quadrilátero Vilas do Sol, uma das iniciantes do movimento Pró-Pinheiros.

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