18/02/2019 às 18h29min - Atualizada em 05/05/2021 às 09h53min

A difícil arte da arquitetura em seu urbanismo necessário

Há uma relação estreita entre a concepção de obra arquitetônica e o contexto urbano consolidado ou em processo de reestruturação, mesmo que ambos sejam públicos. Esta composição cria reflexões em seu observador usuário, como protagonista principal da cidade, na qual arquitetura é letra e o urbanismo música. Como esta relação sensorial nem sempre é evidente ou ponderável, torna-se difícil sua leitura e codificação, sendo indispensável extrair elementos críticos de experiência profissional, no processo de criação em questão, que os direcionem à harmonia urbana. Diante deste grau de dificuldade, nem sempre esse resultado consegue ser atingido, neste caso, certamente haverá ruídos em prejuízo do ambiente. A viela afetiva, o caminho, a rua e  verdes praças são a expressão de nossa mobilidade e lazer, articulam a socialização e o habitar, que ao se contextualizarem em espaço decifrável e confortável, valorizam a cidade, certamente qualificando-a ambientalmente. Nossa cidade cresceu em velocidade incompatível com sua própria gestão: era um bairro esquecido de Portugal, que de forma incontida, tomou café e transformou-se bruscamente em país indecifrável, subdesenvolvida. Diante de fatídica condição, há que se verbalizar propostas que alimentem redesenhos ambientais de convivência prospectiva e, enfim, resolvam tantos problemas sociais que propiciam deseconomia urbana. Para exemplificar, há sérios condicionantes históricos de organização territorial, composta basicamente de ruas racionalizadas em retículos de lotes dentro de quadras, suportando, por milênios, cidades horizontais. Esta raiz, há menos de dois séculos, vem condicionando a metamorfose da verticalização de cidades. São Paulo, cultural e economicamente expoente, em contraponto à habitual utilização do solo em rápida especulação, diante do seu caminho desgovernado, pode adotar conceito prospectivo ao seu desenho de reformulação, de redesenho possível e necessário da quadra como “lote único”. A pretendida ambientação diferenciada sob legislação não só trará correções de enormes ruídos entre habitações horizontais unidas a prédios como credenciará, aos originários proprietários, títulos compensatórios diferenciados. Os males causados por essa “convivência” devem ser corrigidos por política nacional de uso de seu território, abolindo a atávica aceitação do erro. Em 1995, no século passado, divulgamos este conceito de “quadras metropolitanas” e o reproduzimos neste jornal com simulação de uso, ilustrado com edifício aberto à rua dos Pinheiros em seu embasamento, sem muros, antes da recente inauguração da estação de metrô Fradique Coutinho, que transformaria a região. Hoje a rua dos Pinheiros e Avenida Rebouças são capa deste e outros jornais, assim como seu bairro. Vários empreendimentos são carregados pela força tardia do Metrô e do atual Plano Diretor. Há especial atenção no fato destas ruas serem planas e de passeios largos desde a avenida Brasil passando pela  estação Fradique (aguardando a retirada de floreira, barreira supérflua no passeio) até a Faria Lima, junto ao Largo da Batata, facilitando pedestres. As novas edificações que viabilizarem a complementação, valorizando o pedestre com seus embasamentos, em uso misto voltados à cidade, irão criar aderência à integração social. As características peculiares deste privilegiado espaço, somado a edifícios abertos, sem muros, corretamente nos afastará da especulação de qualquer tipo de shopping, com ar condicionado, que enclausura pessoas amarradas ao carro. Quanto à nova paisagem em rápido curso, é de se supor  que haja diálogo  entre arquitetura e urbanismo, ainda que não tenhamos, como vizinho, nenhuma “quadra” com edifício feliz, pleno em fachadas arejadas por moldura de ruas. Projeto  arrojado de difícil aceitação, contra interesse de corporações de mercado, garantiram lucrativamente a retirada de poluidores backlights da paisagem paulistana, enorme contribuição de nossa colega Regina Monteiro. Em memória de amigo, um ano distante,  Carlos Bratke, ressalta-se seu último edifício, já concluído, projetado à rua Capitão Antônio Rosa, feliz proposta de seu interior inteligente. Fomos contemplados, como vizinhos, com volume proporcional de harmonioso cubo, com vidros protegidos por faces piramidais limpas dirigidas ao interior, suspenso em pilotis com serviços voltados à rua. Infelizmente não temos ainda legislação que pudesse viabilizar essa pequena volumetria, singela e livre, à amplitude visual urbana, como norma de proposta mais harmoniosa da brusca transição entre zonas verdes (vistas  disputadas pelo marketing), e a necessária verticalização. Só mesmo vendo o resultado final destes projetos para podermos ter uma rua cujas obras sejam uma orquestra, e que não haja impulsos incontidos de modismo, eventualmente forçando aos profissionais recursos de mercado. As novas obras que nascem no bairro  apresentam-se com ótimo resultado de gerenciamento e tecnologia construtiva que revelam o competente detalhamento da arquitetura. Esperamos que este impulso regional de nosso bairro, caso também atraia empreendedores e profissionais estrangeiros, seja contribuição à nossa arquitetura, afastando meros exercícios volumétricos de caixa de vidro e que os  leve a considerar os nossos valores mencionados. É benéfica a divulgação constante da mídia sobre as artes da arquitetura e do urbanismo, integradas à engenharia, geografia e história, para que propicie a compreensão de seu grau de dificuldade, em busca de entender e atender à sociedade com sua beleza e pertinência. Arquiteto e urbanista Nadir Mezerani


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